TIRANDO A VENDA DOS OLHOS


Conta-se que os índios Cherokees americanos têm um interessante rito de passagem. Ao final da tarde, o pai leva o filho adolescente para a floresta, venda-lhe os olhos e deixa-o sozinho. O filho se senta sozinho no topo de uma montanha toda a noite, não podendo remover a venda, até que os raios do sol brilhem no dia seguinte.

Ele não pode pedir socorro, nem deve esperar que alguém o ajude. Se ele conseguir passar a noite toda ali, sozinho, será considerado um homem. Há uma proibição expressa: ele não pode, em hipótese alguma, contar a experiência aos outros meninos da tribo. A razão é que cada um deve tornar-se homem do seu próprio modo, enfrentando bravamente o medo do desconhecido.

O menino está naturalmente amedrontado. Ele pode ouvir toda espécie de barulho. Os animais selvagens podem, naturalmente, estar ao redor dele. Talvez alguns humanos possam feri-lo. Os insetos e cobras podem vir picá-lo. Ele pode estar com frio, fome e sede. O vento sopra a relva e a terra sacode os galhos, mas ele se senta estoicamente, nunca removendo a venda. 

Segundo os Cherokees, este é o único modo do jovem se tornar um homem de verdade. Finalmente, após a horrível noite de solidão, o sol aparece e a venda lhe é removida. Então, ao abrir os olhos, ele descobre seu próprio pai sentado na montanha perto dele. Ele estava a noite inteira protegendo seu filho do perigo, embora este não tivesse consciência disso.

Que lição podemos apreender dessa simples lenda? Fiquei a pensar nas vezes em que nos sentimos sozinhos, como se Deus não se importasse, como se o fardo que carregamos fosse só nosso, e de mais ninguém, como se a solidão fosse a única certeza. Quem nunca passou por um momento assim?

Ao lermos a história de grandes homens de Deus, a maioria já carregou o peso de se sentir abandonado, exatamente nas horas em que mais precisava de apoio e incentivo. Abraão, Moisés, Jó, Daniel, Elias, Jesus, e muitos outros, já se sentiram “desamparados”. Mas todos eles, ao terem a venda tirada dos olhos, viram o quanto Deus estava perto, embora por um tempo não o tivessem notado.

Jeremias mostra todo o sentimento de abandono em que se encontra. Ele sentia-se só, um verme ambulante, motivo de escárnio do povo, como se Deus estivesse muito distante. Mas, então, ele se lembra de como o Senhor costuma tratá-lo, e afirma: “Quero trazer à memória o que me pode dar esperança. 


As misericórdias do Senhor são a causa de não sermos consumidos, porque as suas misericórdias não têm fim; renovam-se cada manhã. Grande é a tua fidelidade. A minha porção é o Senhor, diz a minha alma; portanto, esperarei nele” (Lm 3.20-24). Mas quem poderia dizer que Jesus, o Filho de Deus, poderia se sentir desamparado? Ora, Ele passou por isso também.

Jesus havia sofrido terríveis dores na alma em sua oração no Jardim do Getsêmane. Agora, pregado na cruz, ao lado de dois ladrões, enfrentando o escárnio das pessoas, recebendo sobre si mesmo os pecados (os nossos pecados), as dores e enfermidades da humanidade, sentiu como se Deus o tivesse abandonado.

Em meio à escuridão das trevas, Jesus brada em completa agonia: “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?” 
Depois, confiante, Jesus clamou em alta voz: “Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito!”

Como poderia Deus tê-lo abandonado, se Jesus se sente confiante em entregar-lhe o espírito? Era a venda nos olhos, pois ali estava Jesus, o Homem de dores e que sabe o que é padecer, expressando a Sua humanidade.

A lição que apreendemos é que, de igual modo, nunca estamos sozinhos! Mesmo quando as trevas nos impedem de perceber a presença de Deus, isso não significa que Ele não esteja conosco, logo ali, sentado ao nosso lado.

Deixe Deus tirar a venda dos seus olhos, e verá que Ele jamais deixou de estar ao seu lado e jamais abandonará você.

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