Adidas x Puma
Uma briga de mais de 60 anos
A pequena e impronunciável cidade alemã de Herzogenaurach, com pouco
mais de 23.000 habitantes, parece ser apenas mais um vilarejo da Bavária,
na bela região cortada pelo Rio Aurach.
Herzogenaurach, onde tudo começou
Mas o que diferencia
Herzogenaurach de qualquer
outra cidade é o fato de ser sede de duas das maiores empresas de material
esportivo do planeta: ADIDAS e PUMA.
Adolf Dassler (1900 - 1978)
Seu fascínio pelos calçados esportivos criou uma das mais poderosas corporações alemãs
Nos próximos parágrafos você conhecerá um
pouco mais desta curiosa história, repleta de idealismo, paixão, intrigas e
traição, que acompanhou a história alemã por boa parte do Século XX, do
nascimento do Nazismo à globalização, passando pelos horrores e sacrifícios de
uma guerra e a reconstrução da identidade da maior potência europeia.
A primeira fábrica de calçados dos irmãos Dassler, em 1924
Em uma Alemanha que tentava se recuperar
da derrota da Primeira Guerra Mundial, no início dos anos 20, Adolph
"Adi" Dassler seguiu os passos de seu pai, um fabricante de sapatos,
e começou a produzir calçados esportivos na lavanderia de sua casa. Seu irmão
Rudolph Dassler, que tentara sem sucesso alguns outros trabalhos depois de
retornar do "front", decidiu juntar-se a Adolf, e em 1924 fundaram
juntos a Gebruder Dassler Schuhfabrik ("Fábrica de Sapatos dos Irmãos
Dassler").
Foto do inteiror da fábrica dos irmãos Dassler.
Durante a Grande Depressão, bicicletas adaptadas moviam as máquinas
Com a humilhação sofrida ao final da
Primeira Guerra e em plena "Grande Depressão", a Alemanha estava em
uma situação econômica terrível, e muitas vezes as máquinas dos irmãos Dassler
trabalhavam movidas pela força física de seus funcionários, usando bicicletas
modificadas, devido aos constantes cortes de energia elétrica.
A Águia e a Suástica, símbolos do Partido Nazista
Para a maioria dos empresários alemães da década de 30, apoiá-los era um "mal necessário"
Porém, a situação melhorou muito quando
motivados pela necessidade de melhores condições para seu negócio, alinharam-se
com um aliado poderoso: o emergente "Partido Nazista". Depois do
acordo, nem é preciso dizer que as condições de trabalho melhoraram muito,
principalmente depois que seu "xará" Adolf Hitler subiu ao poder em
1933, e "Adi" pôde desenvolver sua vocação: projetar e produzir
calçados esportivos para atletas de alta performance.
Adolf "Adi"Dassler (esq) e seu irmão Rudolf Dassler (dir)
http://en.wikipedia.org/wiki/Adolf_Dassler
http://en.wikipedia.org/wiki/Rudolf_Dassler
http://en.wikipedia.org/wiki/Adolf_Dassler
http://en.wikipedia.org/wiki/Rudolf_Dassler
E foi com uma estratégia de marketing inusitada
que os irmãos Dassler ficaram conhecidos mundialmente: Em 1936, Hitler
planejava mostrar ao mundo a superioridade da raça ariana conquistando uma
quantidade esmagadora de medalhas nos Jogos Olímpicos de 1936, realizados na
Alemanha.
Cartaz das Olimpíadas de Berlim em 1936
Hitler queria mostrar ao mundo a "superioridade ariana"
Mas impressionado com o desempenho do corredor negro norte-americano
Jesse Owens, Adolf Dassler dirigiu da Bavária até Berlim com uma mala repleta
de sapatilhas de corrida, e foi ao encontro de Owens oferecendo patrocínio.
Jesse Owens, o homem que calou Hitler, ganhando 4 Medalhas de Ouro em território alemão
Owens aceitou a proposta e para desespero de Hitler, que assistia a tudo das
tribunas, ganhou nada menos que 4 medalhas de ouro naquela competição. Nascia
ali não apenas uma lenda do esporte, mas também uma lenda do material
esportivo.
As sapatilhas de Jesse Owens em 1936, feitas por Adolf Dassler
O formato e os cravos favoreciam as arrancadas
Não há registros de nenhum tipo de
represálias de Hitler aos irmãos Dassler pelo patrocínio à Owens, mas pode-se imaginar que o
"Fuhrer" não deve ter ficado muito satisfeito com esta história...
Hitler assistiu aos Jogos de 1936 das Tribunas do Estádio de Berlim
Viu muitas vitórias, mas Jesse Owens ficou "entalado em sua garganta"
Alguns anos depois, a Segunda Guerra
Mundial causaria a cisão da Gebruder Dassler Schuhfabrik. A filiação
ao Partido Nazista, que para Adolf tinha sido apenas um "mal
necessário" para manter a empresa funcionando, para Rudolf parecia ser
algo bem mais sério. O irmão mais velho aprofundava cada vez mais seu
envolvimento com a ideologia nazista, causando algumas "rusgas"
familiares, que explodiram junto coma s bombas que os aliados jogavam sobre as
grandes empresas alemãs...
De calçados para Bazucas
O esforço de guerra alemão fez com que várias empresas passassem a produzir armas
Assim como várias outras empresas alemãs,
a fábrica dos irmãos Dassler foi utilizada para fins bélicos durante a Segunda
Guerra. As instalações e boa parte dos operários de Herzogenaurach tiveram a improvável
tarefa de aprender a fabricar bazucas ao invés de sapatos esportivos.Apesar de
alguns contratempos no início, as armas fabricadas por lá destruíram muitos
tanques aliados, e os mais exaltados declaram que as armas eram tão
fáceis de usar e eficientes que caso tivessem sido fabricadas em maior
quantidade, causariam sérios problemas aos inimigos dos alemães.
Instalações da empresa Krupp destruídas por bombardeios aliados em 1944
Várias empresas alemãs tiveram este destino
Diz a lenda que apenas a casa de Adolf
possuía um abrigo antibombas, e durante os pesados bombardeios aliados sobre a
Bavária no período final da Segunda Guerra, as famílias tiveram que morar
juntas. Certa noite, num momento de irritação, depois de ser tirado mais uma
vez da cama para dirigir-se ao abrigo, Adolf teria dito "Os bastardos estão de volta",
referindo-se aos aviões aliados. A esposa de Rudolf, porém, entendeu que seu
cunhado referia-se à sua família, e contou o episódio ao marido. Quando logo
após o final da guerra Rudolf foi convocado a dar explicações sobre seu apoio
ao Nazismo, ele achou que tinha sido seu irmão que o denunciara, e tanto a
família quanto a empresa separaram-se para sempre, apesar de Adolf negar até a
morte ambos os fatos que deram origem à separação. A partir de 1948, cada um
dos irmãos estava de um lado do Rio Aurach.
Adolf Dassler juntou seu apelido "Adi" com as iniciais de seu sobrenome "Dassler"
para criar o nome de sua empresa: ADIDAS
Adolf usou as iniciais de seu nome
"Adi" (um apelido usado desde a infância) e o sobrenome Dassler para
criar a marca ADIDAS. Rudolf inicialmente copiou o raciocínio do irmão, e
chamou sua marca de RUDA. Sabiamente, depois de perceber que o nome não era
adequado, mudou-a para PUMA.
Rudolf inicialmente chamou sua empresa de "RUDA",
mas o nome era tão ruim que logo mudou para PUMA
Inicialmente, a ADIDAS teve muito mais
sucesso, graças ao senso de oportunidade e sorte de Adolf, que patrocinou a
seleção alemã da Copa de 1954, realizada na Suiça.
Seleção alemã na Copa de 1954
Os calçados nazistas ajudaram a realizar o "Milagre de Berna"
A Alemanha ganhou seu primeiro título
mundial de futebol derrotando os poderosos húngaros de Puskas (que não jogou a final) por 3x2, na
partida que ficou conhecida como "O milagre de Berna". Mais uma vez a
ADIDAS mostrava ao mundo o poder de um bom material esportivo, pois a partida
foi disputada debaixo de muita chuva, e os calçados alemães permitiam uma
melhor mobilidade no campo encharcado, contribuindo decisivamente para o
resultado.
Desde os anos 60, Adidas e Puma disputam patrocínio das maiores celebridades esportivas mundiais
A partir da década de 60, ADIDAS e PUMA
passaram a brigar pelo patrocínio de grandes nomes do esporte: astros do Tênis,
Natação, Futebol, Atletismo e outras modalidades começaram a receber dinheiro
para usar material de cada uma das empresas, num movimento que teve dois
momentos muito marcantes: O "Pacto Pelé" na Copa de 1970 e a insubordinação
do holandês Cruyff em 1974.
O "Pacto Pelé"
Pelé, o maior jogador de futebol da história
Envolveu-se em uma das maiores brigas entre ADIDAS e PUMA
Algum tempo antes da Copa do México em
1970, ADIDAS e PUMA fizeram um "pacto" de não patrocinar Pelé, pois a
disputa pela preferência do brasileiro poderia causar uma guerra de propostas
com valores exorbitantes, que acabariam por prejudicar ambas as empresas.
Parecia que pelo menos uma pequena dose de bom senso havia sido injetada
naquela briga que já havia sido passada como herança para os descendentes de
Adolf e Rudolf. Porém, quando as câmeras de televisão transmitiram o momento em
que Pelé checava o laço de suas chuteiras momentos antes do apito inicial de
uma das partidas da fase eliminatória, o que se viu foram longos segundos de
"close" em um calçado da PUMA. Graças ao Pacto, o acordo fora fechado
por apenas 25 mil dólares e uma participação nas vendas. A fúria de Horst
Dassler, filho de Adi, então à frente da ADIDAS, foi tal que chegou às vias de
fato...
Réplica da chuteira usada por Pelé em 1970
Cruyff e as 3 Listras
Johan Cruyff, o maestro de uma das melhores e mais inovadoras seleções de todos os tempos
Tinha fama de "mercenário"
Apesar de ter obtido um grau de exposição
inédito 4 anos antes com o episódio no México, a PUMA ainda continuava sendo
uma empresa bem menor que sua poderosa vizinha ADIDAS. Portanto, ao invés de
patrocinar centenas de atletas de várias modalidades como fazia sua rival, a
PUMA focava em alguns grandes astros, e entre os principais estava o holandês Johan Cruyff.
Quando a ADIDAS anunciou o patrocínio da
seleção holandesa para a Copa de 1974 na Alemanha, estava criado um grande
problema. Como Cruyff iria usar uma camisa ADIDAS ? Numa jogada de marketing, o
empresário de Cruyff declarou que ele poderia até dormir com sua filha, mas não
usaria o uniforme de outro patrocinador.
A curiosa camisa holandesa de Cruyff na Copa de 1974
Apenas duas listras
Preocupada com a ira dos holandeses que
temiam não ver seu principal jogador atuar na primeira Copa do Mundo que
participavam desde 1938, e também de ser responsabilizada pela ausência de uma
das estrelas da competição, ADIDAS e PUMA combinaram uma solução
"Salomônica" para o impasse: a camisa 14 da seleção holandesa teria
apenas duas listras, e não as tradicionais 3 listras da ADIDAS.
As belas sedes da Adidas (acima) e da Puma (abaixo), em Herzogenaurach
Há muito tempo a produção de ambas as
empresas mudou-se de Herzogenaurach para outros países, em busca de mão-de-obra mais
barata, mas a cada grande evento esportivo ADIDAS e PUMA investem dezenas de
milhões de Euros em patrocínios.
Um dos anúncios da ADIDAS nas Olimpíadas de Beijing em 2008
Investimentos de dezenas de milhões de dólares em patrocínio
Em
2009, funcionários das duas empresas disputaram uma partida de futebol amistosa
em Herzogenaurach para selar a paz entre as famílias depois de 60 anos de brigas, mas uma coisa é certa: esta
história está muito longe de acabar...
CEOs da ADIDAS e PUMA em jogo amistoso entre funcionários em 2009
Uniformes misturados e promessas de paz depois de 60 anos de brigas
Abaixo segue link para um excelente
infográfico contando a história da ADIDAS, PUMA e NIKE numa linha do
tempo. Vale a pena conferir!
Clique na imagem para ampliar
A Internet está repleta de bons sites, com
muitos detalhes, fotos e textos para quem quiser conhecer mais sobre esta
curiosa história
A história do
"Pacto Pelé"
Mais sobre Cruyff
e sua camisa de 2 listras
Mais informações
preciosas e interessantes em...
Localização de Herzogenaurach na Alemanha
Nota: Obrigado ao Antônio Carlos, que me contou a história de Cruyff, e motivou a inclusão no post
Read more: RIOBLOG: Adidas e Puma: a curiosa história de amor e ódio nas empresas que mudaram o esporte http://the-rioblog.blogspot.com/2012/01/adidas-x-puma-uma-briga-de-mais-de-60.html#ixzz1jpArFPnv
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